setembro 30, 2004

Dedicatória a Camões

Grande Camões, como poderias tu, naquela altura, saber tanto de mim???

O dia em que nasci morra e pereça,
Não o queira jamais o tempo dar;
Não torne mais ao Mundo, e, se tornar,
Eclipse nesse passo o Sol padeça.
A luz lhe falte, o Sol se [lhe] escureça,
Mostre o Mundo sinais de se acabar,
Nasçam-lhe monstros, sangue chova o ar,
A mãe ao próprio filho não conheça.
As pessoas pasmadas, de ignorantes,
As lágrimas no rosto, a cor perdida.
Cuidem que o mundo já se destruiu.
Ó gente temerosa, não te espantes,
Que este dia deitou ao Mundo a vida
Mais desgraçada que jamais se viu!

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Os bons vi sempre passar
No Mundo graves tormentos;
E pera mais me espantar,
Os maus vi sempre nadar
Em mar de contentamentos.
Cuidando alcançar assim
O bem tão mal ordenado,
Fui mau, mas fui castigado.
Assim que, só para mim,
Anda o Mundo concertado.


Sim, é verdade. Antes de eu descobrir os "Doors" e o Jim Morrisson se tornar o meu deus, o meu Guru, a minha luz, eu tinha descoberto Luís Vaz de Camões.
Comecei por descobrir os pequenos textos, ditos Sonetos, que toda a gente conhece, "Amor é fogo que arde sem se ver", "Alma minha gentil, que te partiste" e Redondilhas, "Perdigão perdeu a pena/Não há mal que não lhe venha" e quanto mais o descobria mais me apaixonava por ele, mais me encontrava nos escritos dele.
Quando já me tinha rendido à sua magnitude, resolvi pegar nos Lusíadas (dá-se nas escolas, não sei se sabem). É claro que não o li todo, isso seria suicídio para um jovem, mas li as passagens mais importantes e rematei o conhecimento com a ajuda de livros, professores e uma cassete áudio, que me chegou ás mãos pela minha professora de Português Dália Dias, que continha excertos dos Lusíadas narrados com um toque teatral pela voz de João Cardoso, que proporcionava uma deliciosa viagem sobre esta grande epopeia (receio ter perdido o rastro a esta cassete).
Se eu já me tinha rendido à "magia" de Camões, quando tomei, finalmente, contacto com o "interior" dos Lusíadas fiquei completamente de rastos. Automaticamente Camões saltou para o meu pedestal dos deuses.
E quem é que pode esquecer aquela fabulosa cena do espectáculo "Vai no Batalha" do Teatro de Marionetas do Porto em que a marioneta/poeta entra magistralmente em palco pelas mãos do grande Rui Oliveira e diz:

"E agora um breve momento de poesia. (And now for something completely different, diria eu)
De Luís Vaz de Camões... Os Lusíadas.

As Armas e os barões assinalados
Que da Ocidental praia Lusitana
Por mares nunca dantes navegados....
"

Ahhh... Pudera o tempo parar para gozar em pleno estas pequenas relíquias que a história e o pó da memória vão cobrindo e apagando...

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