setembro 02, 2004

AIDS No More (III)

VII
Passado uns dias James recebeu um telefonema. Era Watson a dizer-lhe que a operação era para o dia 13 de Maio. James tinha dois meses pela frente antes da operação.
Esses dois meses passaram bastante depressa, no ponto de vista de James, mas, mesmo assim, James não recuou na sua resposta.
No dia 10 de Maio James telefonou para Watson.
— Estou? — perguntou Watson — Quem fala? Ahh! És tu James. Então como te sentes?
— Mais ou menos. — respondeu James, com a voz seca — Os meus nervos é que estão um bocado descontrolados.
— Isso é normal, não te preocupes. — disse Watson, que tentava ser o mais natural possível.
— A que horas é que tenho que estar aí? — perguntou James.
— Quando? Para a operação? Às 9:30 da manhã. Pode ser?
— Sim. Por mim tudo bem.
James despediu-se de Watson e desligou o telefone. Foi ter com Christine e disse-lhe a que horas é que tinha que estar no hospital.
Christine chorou, chorou muito antes de lhe perguntar:
— Jim? Porque é que as pessoas têm de morrer?
— Essa sempre foi e sempre será a grande questão no mundo. — disse James, pensativo — Um homem vive para morrer e ninguém sabe porquê. Eu, pelo menos, tenho uma boa razão para morrer. Posso morrer, mas, ao menos, salvo milhares de pessoas da morte. Morro de consciência tranquila, sei que fiz, ou tentei fazer, uma grande coisa para a humanidade. Tal como disse Armstrong ao pisar a lua: «Um pequeno passo para o homem, mas um grande passo para a humanidade».
— Mas, Jim — disse Christine, tristemente — Eu não quero que tu morras. O que é que eu vou dizer ao nosso filho, que pode vir a nascer órfão de pai?
— Diz-lhe — disse James, abraçando-se a Christine — que tenha orgulho do pai. Porque ele salvou milhares de pessoas e, provavelmente, será o herói da década de 90, ou até do séc. XX.
James e Christine começaram a chorar. Faltavam só dois dias para a maldita operação e havia grandes possibilidades de James morrer. Tanto James como Christine receavam essa operação. Na última semana antes da operação andavam nervosíssimos, não conseguiam dizer coisa com coisa.
Mas era Christine que sofria mais, James aparentava calmia e tranquilidade.
No dia anterior à operação a casa de James parecia a Casa dos Macacos no Jardim Zoológico. James tinha convidado Watson para passar lá a tarde. Mas ninguém se conseguia entender, o nervosismo era tanto que ninguém dizia coisa com coisa. Enquanto Watson falava sobre carros, Christine estava a falar sobre bolos e James sobre desporto.
Ao final da tarde, quando Watson ia a sair da casa de James, estavam todos a chorar.
— Então, James, amanhã às 9:30. — disse Watson limpando as lágrimas.
— Às 9:30 estarei lá.— disse James, abraçando-se, novamente, a Watson — Não te preocupes.
VIII

No dia seguinte, às 9:30, já James se encontrava no hospital. Estava a falar com os Drs. Brie, Limbourguer, Donald, Stone e Watson. Os Drs. Brie, Donald, Limbourguer e Stone eram os médicos que iam fazer a operação, Watson só estava lá para ver James.
Christine estava sentada no quarto onde, provavelmente, James iria ficar depois da operação. Watson entrou no quarto e Christine, levantando-se, perguntou-lhe:
— Então? O James como é que está?
— Calma — disse Watson, nervoso — estavam agora a dar-lhe o sedativo. Vão começar com a operação. Agora temos de esperar por algumas notícias.
— Quanto tempo — perguntou Christine — vai demorar a operação?
— O Dr. Donald — disse Watson — disse-me que deveria demorar, mais ou menos, duas horas.
Christine sentou-se na beira da cama. Watson puxou uma cadeira e sentou-se ao seu lado. Durante alguns momentos ficaram ali sentados sem dizerem uma única palavra. Foi Christine quem interrompeu o pesado silêncio.
— Já sabe que o nosso filho vai ser um rapaz?
— Já, — disse Watson — já sabia. Foi o James que me disse ontem.
— E, — disse Christine, pausadamente — também lhe disse como se irá chamar?
— Não, — disse Watson, surpreendido — não me disse.
— O seu nome será Erik Douglas Thomson Cooper.
— E porquê — perguntou Watson, comovido — o nome de Erik?
— James — disse Christine — disse que lhe queria pôr o seu nome Erik Watson, porque era o seu melhor amigo, mas depois decidiu-se pôr só Erik em sua homenagem.
Começaram a escorrer lágrimas na face de Watson. Christine ficou a vê-lo chorar. Era tão bom ter uma amizade assim, James e Watson conheciam-se desde os dez anos e, a partir daí, nunca mais se separaram. James gostava muito de Watson, mais do que qualquer coisa no mundo, é claro que também gostava de Christine, mas de maneira diferente. Nem o próprio Watson se tinha apercebido do quanto James gostava dele, até à altura.

Passado uma hora entra no quarto o Dr. Stone. Christine e Watson levantaram-se numa euforia incrível.
— Então doutor, — perguntou Christine, eufórica — como é que está a correr a operação?
— Tenham calma, — disse o Dr. Stone, sorridente — que está tudo a correr bem. James está a aguentar-se bem.
— Ahhh! — disse Watson, mais calmo — Ainda bem.
— Doutor, — perguntou Christine, ainda nervosa — quanto tempo falta para acabar a operação?
— Dentro de meia hora já devemos ter acabado. Mantenham-se calmos ate lá.
Dr. Stone saiu. Christine voltou-se a sentar.
— Sabes, Watson, — disse Christine, nervosa — estou com um mau pressentimento disto tudo.
— Também eu. — disse Watson — Mas agora não podemos pensar nisso. Temos de manter a cabeça fria.
Christine e Watson ficaram ansiosos à espera de mais notícias. Só passado meia hora é que vieram mais notícias.
— Já está tudo terminado. — disse Dr. Brie, ao entrar no quarto — Correu tudo bem.
— E James? — perguntou Christine, ansiosa — Está bem?
— Por enquanto sim. — respondeu Dr. Brie, seriamente — Já deve estar a chegar.
— E... — disse Watson, com receio — Não há perigo de ele....
— Isso só o tempo dirá. Se dentro de meia hora ele não sentir nada, está fora de perigo.

IX
Logo de seguida entra no quarto James deitado numa cama, empurrada por uma enfermeira. James vinha sorridente e confiante.
— Jim, — disse Christine, começando a chorar — Jim estás bem?
— Mais ou menos. — respondeu James, com a voz trémula — E vocês como é que estão?
— Super-preocupados, — disse Watson — como podes imaginar.
— Não precisam de estar, — disse James — correu tudo bem. Eles já têm o ANM e a mim só me resta morrer.
— Oh! Jim. — disse Christine, apavorada — Não digas asneiras. Ainda podes sobreviver.
— Não. — disse James, confiante — Sei que tenho pouco tempo de vida. Cheguei a um ponto onde já não tenho nada a fazer neste mundo. Sei que chegou a minha hora. Já fiz o meu trabalho, agora a morte só tem que me vir buscar.
— Mas James, — disse Watson, escorrendo as lágrimas pela face — nós não queremos que tu morras. Nós amamos-te. Tu és a nossa família, sem ti não somos ninguém.
— Eu também vos amo. — disse James, seriamente — Mais do que qualquer outra coisa no mundo. Mas é o destino que me chama. Descobri que vim ao mundo para salvar milhares de pessoas. Era o meu destino e já o concretizei. Eu também queria ficar ao vosso lado, ver o meu filho crescer, mas não posso. Cada vez mais sinto que chegou a minha hora. Este mundo é estúpido. Um homem vive para morrer. Neste mundo só há ganância, rivalidade, desprezo. É um mundo onde não há paz, onde não há felicidade, onde há desgostos e pobreza. Não! Não, este mundo não me merece. Agora sou um herói, fiz qualquer coisa para mudar este mundo cruel e, por isso, já não tenho lugar neste mundo. A morte é a minha única solução, pelo menos vou partir para um mundo muito melhor que este, onde há paz, amizade, amor... Vou-vos deixar, mas antes quero-vos dizer que vos adoro. Christine, toma conta do meu filho, não tomas? — Christine respondeu com um aceno de cabeça, depois virando-se para Watson, James disse — Watson, toma conta da Christine, nunca a deixes sozinha, cuida bem dela.
James pegou na mão de Crsitine e beijou-a, chamou Watson e pegou-lhe, também, na mão. Endireitou-se na cama, fechou os olhos e morreu. Christine e Watson ficaram durante muito tempo a chorar agarrados às mãos de James.
James? Esse foi enterrado no Cemitério de Los Angeles, dois dias depois da sua morte.
Na sua campa estava escrito:

R. I. P.

Aqui jaze
James Douglas Cooper
Aquele que sacrificou a sua vida para salvar a humanidade do vírus HIV.
Não fiz nada de especial, apenas fiz o que o meu destino me mandou

THE END
1997

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